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domingo, 18 de março de 2012

A MULHER NO CONTEXTO SOCIOPOLÍTICO E INTELECTUAL NA PÓS-MODERNIDADE



Adenilse Aparecida Fumagali
Graduada em Filosofia pela Faculdade de Educação São Luís, Jaboticabal/SP

Este trabalho demonstrará a busca de espaços o qual as mulheres iniciaram ao conciliarem o trabalho doméstico ao trabalho masculino assumindo o lugar de seus maridos nos negócios de família, após eles terem partido para as Grandes Guerras. No século XIX, o capitalismo se consolida e traz consigo novas leis que beneficiam as mulheres e o movimento feminista fortalece e fortifica ainda mais esses ideais de mudanças. Eles enfrentaram seus problemas com revoluções silenciosas, com incansável entusiasmo, encorajamento e buscando trilhar seu caminho na busca de perspectivas melhores, sendo valorizada e reconhecida na sociedade. Essa trajetória da inserção da mulher intelectual na sociedade com convicções filosóficas trará uma interpretação reflexiva e dinâmica em todo o contexto com projeção a um futuro de igualdade sociais e de gêneros.

sábado, 17 de março de 2012

Perspectiva do gênero: maravilhoso e fantástico


                                                                                                               
Nilda Medeiros
Graduada em Letras, pós graduada  em Teoria e Crítica Literária, em Teorias Linguísticas e Ensino e Mestre em Estudos Literários pela Unesp de Araraquara

Os contos de fadas, geralmente, são classificados como contos maravilhosos. Mas para Nelly N. Coelho é imprescindível a distinção de ambos.
De acordo com a autora, os contos de fadas surgiram de poemas Celtas que tratavam de amores estranhos, fatais, eternos, os quais, posteriormente, vão integrar as novelas arturianas que revelam uma preocupação com os valores eternos do ser humano, predominando o aspecto espiritual.
Para Nelly, são contos de fadas com ou sem a presença de fadas, mas sempre se inscrevem no maravilhoso, visto que são ambientados num cenário de magia feérica com reis, rainhas, príncipes, princesas, fadas, gênios, bruxas, gigantes, anões, objetos mágicos, metamorfoses, tempo e espaço fora da realidade natural. Esses contos desenvolvem-se a partir de uma problemática existencial e, predominantemente, tal problemática gira em torno da união de homem e mulher.
Já os contos maravilhosos são de origem de narrativas orientais, que elegeram o aspecto material, sensorial e ético do ser humano; são narrativas preocupadas com as necessidades básicas: estômago, sexo, poder e suas paixões do corpo. E a autora cita como exemplo o acervo de contos maravilhosos reunidos em As Mil E Uma Noites. (COELHO, 1991, p.12-13).
Os contos maravilhosos:
São narrativas que, sem a presença de fadas, via de regra se desenvolvem no cotidiano mágico (animais falantes, tempo e espaço reconhecíveis ou familiares, objetos mágicos, gênios, duendes etc.) e têm como eixo gerador uma problemática social (ou ligada à vida prática, concreta). Ou melhor, trata-se sempre do desejo de auto-realização do herói (ou anti-herói) no âmbito socioeconômico, através da conquista de bens, riquezas, poder material etc. Geralmente, a miséria ou a necessidade de sobrevivência física é ponto de partida para as aventuras da busca.(COELHO, 1991, p.14).

Para Tzvetan Todorov (apud VOLOBUEF, 1993, p. 99-100), o maravilhoso é um gênero que apresenta o sobrenatural sem surpresa, choque ou hesitação. Este gênero difere do estranho, gênero que abriga uma trama em que figuram personagens e ações, a princípio incomuns, mas que de acordo com o desenvolvimento dos fatos acabam sendo aceitos por serem explicados de acordo com o mundo natural. E o fantástico situa-se no campo que divide, separa o maravilhoso e o estranho, mas ele é fugaz e dura apenas o instante da permanência de dúvida quanto à natureza dos acontecimentos narrados, se são naturais ou sobrenaturais.
O conto de fadas faz parte destas variedades do gênero maravilhoso.

1.4 A estrutura do conto de fada

Segundo Todorov (apud VOLOBUEF, 1993, p. 100), o “que distingue o conto de fadas é certa escritura, não o estatuto do sobrenatural”. E como demonstra Karin Volobuef, o conto de fadas desenvolve temas universais, as ações giram em torno das tarefas e do herói, as emoções e o caráter das personagens são apreendidos a partir de seus atos, visto que as personagens não são descritas física e psicologicamente. As personagens, às vezes, recebem nomes genéricos ou comuns ou nem recebem e são denominadas pelo que representam na narrativa. Esta, obedece à ordem cronológica dos acontecimentos, os quais não são marcados com data ou lugar e transcorrem no domínio do Era uma vez. A narrativa não abriga longas descrições e o narrador se apresenta em terceira pessoa, inscrevendo a objetividade dos fatos.(1993, p. 100-103).

Outros aspectos a observar no conto de fadas é se está  construído de acordo com a estrutura morfológica de contos de fadas apresentada por Propp. Se  Inicia-se com o protocolo dos contos de fadas: verbo no pretérito imperfeito (Era uma vez); Se apresenta  um desequilíbrio inicial (uma falta). A mudança da história ocorre com a presença de verbo no pretérito perfeito, aludindo à outra referência dos contos de fada, (por ex., Um dia...). Nos contos de fadas é comum a ocorrência da metamorfose (transformação), pois, geralmente, desenvolve-se em torno de uma iniciação do herói (nascimento, casamento, morte, descoberto da identidade etc.). Observar as tarefas que,  geralmente, são três. O cumprimento das tarefas pelo herói, os elementos de ajuda (elementos mágicos),  a recompensa (sanção), e o típico Final Feliz. Os contos de fadas modernos, geralmente, subvertem o “Final feliz”. Os contos de Marina Colasanti são exemplos de tal subversão.

Medeiros, Nilda Maria. A enunciação poética nos contos de Marina Colasanti / Nilda Maria Medeiros – 2009 204 f. ; 30 cm Dissertação (Mestrado em Estudos Literários) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras, Campus de Araraquar
 Orientador: Maria de Lourdes Ortiz Gandini Baldan

       l. Poesia. 2. Contos. 3. Gêneros literários. 4. Colasanti, Marina, 1937-. 
5. Literatura brasileira – Séc. XX. I. Título. 

Acessar site da Unesp – pós-graduação-stricto senso – mestrado – Estudos Literários – 2009    Nilda Maria Medeiros
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e Prosa. 5. ed.Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1979.
ARISTÓTELES. Arte retórica e Arte Poética. Tradução de Antônio Pinto de carvalho. Rio de Janeiro: Ediouro. s.d.
CASSIRER, Ernst. Linguagem e mito. Trad. J. Guinsburg e Miriam Schaiderman. 3. ed. São Paulo: Perspectiva. 1992.
COELHO, N. N. A literatura infantil: história, teoria e análise (das origens ao Brasil de hoje). São Paulo: Quíron; Brasília: INL/MEC, 1981.
CORTÁZAR, Júlio. Valise de Cronópio. São Paulo: Perspectiva, 1974.
DICIONÁRIO DE MITOLOGIA GRECO-ROMANA. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
ELIADE, M. O sagrado e o profano: a essência das religiões. Trad. Rogério Fernandes. Lisboa: Livros do Brasil, s. d.
FIORIN, José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2006.
FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In: RABINOW, P.; DREYFUS, H. Michel Foucault. Uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
GREGOLIN, Maria do Rosário V. (org.). Filigranas do discurso: as vozes da história. Araraquara: Cultura Acadêmica, 2000.
GRIMM, J. e W. O fuso, a lançadeira e a agulha. In: ______. Contos e
lendas. Tradução de Íside M. Bonini. São Paulo: Edigraf, 1961, v. 6.
p. 51-57.
HOLANDA, Chico Buarque de. Letra e Música. São Paulo:Cia. Das Letras, 1989.
JUNG, Carl G. O.  Homem e seus Símbolos. Tradução: Maria Lúcia Pinho. 5.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
LAJOLO, M., ZILBERMAN, R. Literatura infantil brasileira: história & histórias. 2. ed. São Paulo: Ática, 1985.
LIBOREL, Hughes. As fiandeiras. IN: BRUNEL, Pierre. (ORG.). Dicionário de mitos literários: Trad: Carlos Sussekind e outros. Rio de Janeiro: José Olympio, 4. ed. , 2005.
MENDES, Mariza B. T. Em busca dos contos perdidos. O significado das funções femininas nos contos de Perrault. São Paulo: Editora UNESP: Imprensa Oficial do Estado, 2000.
NUNES, Benedito. 1988. O tempo na narrativa. São Paulo, Ática.
PASCUTTI, Cristina. A Busca do Conhecimento de Nossa Mitologia Pessoal Como Forma de Nos Entendermos no Cosmos. In: RAMOS, Celeste, org. Mitos: perspectivas e representações. Campinas, São Paulo: Alínea, 2005.
PAZ, N. Mitos e ritos de iniciação nos contos de fadas. Trad. Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 1989.
PAZ, Octávio. A tradição da ruptura. In: Os filhos do barro: do romantismo à vanguarda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
______.Verso e Prosa. In: Signos em rotação. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1976.
______. Signos em rotação. São Paulo: Perspectiva, 1996. (Debates, 48).
______. Ruptura e convergência. In:  A outra voz. São Paulo: Siciliano, 2001.
PLATÃO. A República.Tradução de J. Guinsburg. São Paulo: Difusão Européia do Livro. 1965.
PRADO, Adélia. Bagagem. Rio de Janeiro:Guanabara, 1986.
PROPP, V. I. As raízes históricas do conto maravilhoso. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
_____. Morfologia do Conto Maravilhoso. Tradução: Jasna Paravich Sarhan. Organização e Prefácio: Boris Schnaiderman. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1984.
RAMOS, Celeste. (org.). Mitos, perspectivas e representações. Campinas: Alínea, 2005.
 SERRES, Michel. O nascimento da Física no texto de Lucrécio. Tradução: Péricles Trevisan. Araraquara: Editora Unesp  e Edufiscar, 2003.
TODOROV, T. As categorias da narrativa literária. In: BARTHES, R. et al. Análise estrutural da narrativa. Trad. Maria Zélia Barbosa Pinto. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1973.
TOMACHEVSKI, B. Temática. In: TOLEDO, Dionísio de Oliveira (org.). Teoria literária: formalistas russos. Porto alegre, Globo, 1971.
VERNANT, Jean-Pierre. Mito e Sociedade na Grécia Antiga. Tradução de Myriam Campello. Brasília: UNB José Olympio, 1992.
VOLOBUEF, Karin. Um Estudo do conto de Fadas. Revista de Letras. São Paulo: (UNESP), v.33, p. 99-114, 1993.
WARNER, Marina. Da Fera à Loira. Trad.: Thelma Médici Nóbrega. São Paulo: Companhia da Letras, 1999.

sábado, 10 de março de 2012

GÊNEROS DO DISCURSO



Nilda Medeiros
Graduada em Letras, pós graduada  em Teoria e Crítica Literária, em Teorias Linguísticas e Ensino e Mestre em Estudos Literários pela Unesp de Araraquara

Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso.(p. 279) [1]
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável. (idem)
Os gêneros do discurso (orais e escritos) incluem indiferentemente: a curta réplica do diálogo cotidiano (com a diversidade que este pode apresentar conforme os temas, as situações e a composição de seus protagonistas), o relato familiar, a carta (com suas variadas formas), a ordem militar padronizada, em sua forma lacônica e em sua forma de ordem circunstanciada, o repertório bastante diversificado dos documentos oficiais (em sua maioria padronizados), o universo das declarações públicas (num sentido amplo, as sociais, as políticas). E é também com os gêneros do discurso que relacionaremos as variadas formas de exposição científica e todos os modos literários (desde o ditado até o romance volumoso). (p. 280)
Ficaríamos tentados a pensar que a diversidade dos gêneros do discurso é tamanha que não há e não poderia haver um terreno comum para seu estudo: com efeito, como colocar no mesmo terreno de estudo fenômenos tão díspares como a réplica cotidiana (que pode reduzir-se a uma única palavra) e o romance (em vários tomos), a ordem padronizada que é imperativa já por sua entonação e a obra lírica profundamente individual, etc.?(idem)
Importa levar em consideração a diferença essencial existente entre o gênero de discurso primário (simples) e o gênero de discurso secundário (complexo). Os gêneros secundários do discurso – o romance, o teatro, o discurso científico, o discurso ideológico, etc. – aparecem em circunstâncias de uma comunicação cultural, mais complexa e relativamente mais evoluída, principalmente escrita: artística, científica, sociopolítica. Durante o processo de sua formação, esses gêneros secundários absorvem e transmutam os gêneros primários (simples) de todas as espécies, que se constituíram em circunstâncias de uma comunicação verbal espontânea. (p.281)
A distinção entre gêneros primários e gêneros secundários tem grande importância teórica, sendo esta a razão pela qual a natureza do enunciado deve ser elucidada e definida por uma análise de ambos os gêneros. (p.281-2)
Tomar como ponto de referência apenas os gêneros primários leva irremediavelmente a trivializá-los. (p182)
O enunciado – oral e escrito, primário e secundário, em qualquer esfera da comunicação verbal – é individual – possui um estilo individual. Os gêneros mais propícios ao estilo individual são os literários.(183)
As condições menos favoráveis para refletir a individualidade na língua são as oferecidas pelos gêneros do discurso que requerem uma forma padronizada, tais como a formulação do documento oficial, da ordem militar, da nota de serviço, etc. (p.183)
Em cada época de seu desenvolvimento, a língua escrita é marcada pelos gêneros do discurso e não só pelos gêneros secundários (literários, científicos, ideológicos), mas também pelos gêneros primários (os tipos de diálogo oral: linguagem das reuniões sociais, dos círculos, linguagem familiar, cotidiana, linguagem sociopolítica, filosófica, etc.). (283)
Quando há estilo, há gênero. Quando passamos o estilo de um gênero para outro, não nos limitamos a modificar a ressonância deste estilo graças à sua inserção num gênero que não lhe é próprio, destruímos e renovamos o próprio gênero (p.286).
O último parágrafo, p. 286, elucida o que ocorreu com a chamada narrativa poética, na qual se observa a poesia invadindo a prosa, o que culmina no enriquecimento de ambas. Esse estilo literário observa-se no final do século XIX. A primeira manifestação de narrativa poética observa-se nos escritos de Virgínia Wolf, escritora americana. No Brasil, no Modernismo, temos a escrita de João Guimarães Rosa com a novela “Buriti” do livro Noites no Sertão, por exemplo; Clarice Lispector com o conto “Búfalo”, por exemplo; e Marina Colasanti com os seus contos de fadas em alguns aspectos.

EXEMPLOS DE SITUAÇÕES EM QUE SE OBSERVA A DISTINÇÃO E AS PECULIARIDADES DOS GÊNEROS DO DISCURSO.
“Os gêneros secundários absorvem e digerem os primários, transformando-os. Essa transformação ocorre porque eles perdem sua relação com o contexto imediato e sua vinculação com os enunciados concretos dos outros. As cartas e os fragmentos de diários, que compõem o romance Reflexos do baile, de Antonio Callado, têm a forma e a significação desse tipo de comunicação na vida cotidiana. No entanto, eles participam da realidade concreta somente por meio da totalidade do romance, que é um evento artístico e não um acontecimento da vida cotidiana”.
“como se vê há uma interdependência dos gêneros. Os secundários valem-se dos primários, como se explicou acima. Mas existem casos em que os primários são influenciados pelos secundários: por exemplo, uma conversa entre amigos sobre um fato da vida pode adquirir a forma de uma dissertação filosófica” [2]( FIORIN, 2006, p.70).
Os gêneros primários estão nas relações cotidianas e ocorrem mais na oralidade, mas aparece também na escrita: a piada, o bate-papo, a conversa telefônica, etc. . O mail, o bilhete, o chat... (FIORIN, P. 70).
Os gêneros secundários  pertencem a uma comunicação cultural mais elaborada numa linguagem jornalística, jurídica, religiosa, política, filosófica, pedagógica, artística, científica. Aparecem mais na escrita, mas, às vezes, apresentam-se na oralidade: o sermão, o editorial, o romance, a poesia lírica, o discurso parlamentar, a comunicação científica, o artigo científico, o ensaio filosófico, a autobiografia, as memórias. (FIORIN, P. 70).
È importante salientar que os gêneros mudam constantemente. Uns desaparecem e dão lugar a outros que surgem, por exemplo, a epopéia desapareceu, mas surgiram o chat, o blog, o mail etc. (FIORIN, P. 65).


EXEMPLOS DE GÊNEROS HÍBRIDOS
A mudança que se observa nos gêneros do discurso é constante, por isso mesmo ocorre a imersão de um no outro. A crônica, por exemplo, aparece como crônica, como crônica jornalística, como crônica poética, como crônica conto. “...qual é a fronteira que delimita a crônica do conto?” (FIORIN, P. 65).


O relato
Texto subjetivo, às vezes, repleto de detalhes, minúcias, outras vezes apenas um relato. Os verbos que deverão expressar subjetividade estarão sempre em primeira pessoa e no tempo pretérito perfeito, às vezes, imperfeito também, quando for uma experiência vivenciada.
Exemplo:
“Não sei bem dizer como aprendi a ler. A circulação entre os livros era livre (tinha que ser, pensando bem, porque eles estavam pela casa toda, inclusive na cozinha e no banheiro), de maneira que eu convivia com eles todas as horas do dia, a ponto de passar tempos enormes com um deles aberto no colo, fingindo que estava lendo e, na verdade, se não me trai a vã memória, de certa forma lendo, porque quando havia figuras, eu inventava as histórias que elas ilustravam e, ao olhar para as letras, tinha a sensação de que entendia nelas o que inventara.” (in: Um brasileiro em Berlim. Rio de Janeiro: editora Nova Fronteira, 1995. P. 137). João Ubaldo Ribeiro

Relato e poesia - Infância (Carlos Drummond de Andrade)
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia
Eu sozinho, menino entre mangueira
Lia a história de Robinson Crusoé,
Comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz
Uma voz que aprendeu
A ninar nos longes da senzala
E nunca
Se esqueceu
Chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
Café gostoso
Café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo
Olhando para mim
- Psiu... não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito
E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeava
No mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história
Era mais bonita que a de Robinson Crusoé.

ANDRADE, Carlos Drummond. Nova reunião. 19 livros de poesia.3. Ed. R.J, José Olympio, 1987


Crônica poética (“Eu sei, mas não devia” de Marina Colasanti)
Crônica jornalística
Parole Parole Parole (Luís Fernando Veríssimo)

__De uns tempos para cá, eu só penso naquilo.
__Eu penso naquilo desde os meus, sei lá. Onze anos.
__Onze anos?
__É. E o tempo todo.
__Não. Eu, antigamente, pensava pouco naquilo. Era uma coisa que não me preocupava. Claro que a gente convivia com aquilo desde cedo. Via acontecer à nossa volta, não podia ignorar. Mas não era, assim, uma preocupação constante. Como agora.
__Pra mim sempre foi. Aliás, eu não penso em outra coisa.
__Desde criança?!
__De dia e de noite.
__E como é que você conseguia viver com isso, desde criança?
__Mas é uma coisa natural. Acho que todo mundo é assim. Você é que é anormal, se só começou a pensar naquilo nessa idade.
__Antes eu pensava, mas hoje é uma obsessão. Fico imaginando com será. O que eu vou sentir. Como será o depois.
__Você se preocupa demais. Precisa relaxar. A coisa tem que acontecer naturalmente. Se você fica ansioso é pior. Aí sim, aquilo se torna uma angústia, em vez de um prazer.
__Um prazer? Aquilo?
__Bom, na sua idade não sei. Pra mim, é o maior prazer que um homem pode ter. é quando o homem chega no paraíso.
__Bom, se você acredita nisso, então pode pensar naquilo como um prazer. Pra mim é o fim.
__Você precisa de ajuda, rapaz.
__Ajuda religiosa? Perdi a fé há muito tempo. Da última vez que falei com um padre a respeito, só o que ele me disse foi que eu devia rezar. Rezar muito, para poder enfrentar aquilo sem medo.
__Mas você foi procurar logo um padre? Precisa de ajuda psiquiátrica. Talvez clínica, não sei. Ter pavor daquilo não é saudável.
__E eu não sei? Eu queria ser como você. Viver com a perpectiva daquilo naturalmente, até alegremente. Ir para aquilo assoviando.
__Ah, vou. Assoviando e dando pulinho. Olhe, já sei o que eu vou fazer. Vou apresentar você a uma amiga minha. Ela vai tirar todo o seu medo.
__Já sei. Uma dessas transcedentalistas.
__Não, é daqui mesmo. Codinome Biba. Com ela é tiro e queda. Figurativamente falando claro.
__Heim?
__O quê?
__Do que é que nós estamos falando?
__Do que é que você está falando?
__Daquilo. Da morte.
__Ah.
__E você?
__Esquece.
(O Estado de São Paulo – Domingo, 12 de setembro de 1993)

Pensar no jogo do implícito; na referenciação (demonstrativos)
Como sugestão para crianças do ciclo I e da 5ª série, apresentar o texto “Alfinete” do mesmo autor.

Discurso científico e o poético -

Lição sobre a água (Antônio Gedeão)
Este líquido é água.
Quando pura
é inodora, insípida e incolor.
Reduzida a vapor,
sob tensão e a alta temperatura,
move os êmbolos das máquinas que, por isso,
se denominam máquinas de vapor.
É um bom dissolvente.
Embora com excepções mas de um modo geral,
dissolve tudo bem, bases e sais.
Congela a zero graus centesimais
e ferve a 100, quando à pressão normal.
Foi neste líquido que numa noite cálida de Verão,
sob um luar gomoso e branco de camélia,
apareceu a boiar o cadáver de Ofélia
com um nenúfar na mão.

Discurso publicitário e o poético – campanha política americana
I like Ike! (ai laic aic!): slogan de campanha eleitoral americana.


 Poema musical e a carta - Chico Buarque de Holanda/ Francis Hime (Meu caro amigo)

Meu caro amigo me perdoe, por favor
Se eu não lhe faço uma visita
Mas como agora apareceu um portador
Mando notícias nessa fita
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando e também sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
É pirueta pra cavar o ganha-pão
Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita careta pra engolir a transação
E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinho
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se me permitem, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas nesse disco
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
A Marieta manda um beijo para os seus
Um beijo na família, na Cecília e nas crianças
O Francis aproveita pra também mandar lembranças
A todo o pessoal
Adeus

Relato e poesia
Infância (Carlos Drummond de Andrade)
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia
Eu sozinho, menino entre mangueira
Lia a história de Robinson Crusoé,
Comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz
Uma voz que aprendeu
A ninar nos longes da senzala
E nunca
Se esqueceu
Chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
Café gostoso
Café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo
Olhando para mim
- Psiu... não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito
E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeava
No mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história
Era mais bonita que a de Robinson Crusoé.

ANDRADE, Carlos Drummond. Nova reunião: 19 livros de poesia. 3. Ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1987.)

 
Gênero receita culinária e poesia
RECEITA

Ingredientes
2 conflitos de gerações
4 esperanças perdidas
3 litros de sangue fervido
5 sonhos eróticos
2 canções dos Beatles

Modo de preparar
Dissolva os sonhos eróticos
Nos 2 litros de sangue fervido
E deixe gelar seu coração

Leve a mistura ao fogo
Adicionando dois conflitos
De gerações às esperanças
Perdidas

Corte tudo em pedacinhos
E repita com as canções dos Beatles
O mesmo processo usado com os
Sonhos eróticos mas desta vez
Deixe ferver um pouco mais e
Mexa até dissolver

Parte do sangue pode ser
Substituído por suco de
Groselha mas os resultados
Não serão os mesmos

Sirva o poema simples ou com ilusões

Nicolas Behr. “Receita”, disponível em HTTP://www.tanto.com.br/nicolasbehr-livrinhos.htm>, acesso em: 17 de maio de 2006.

Poesia e lenda (figuras do conto de fadas)

Eros e psique (Fernando Pessoa)
Conta a lenda que dormia
Uma princesa encantada
A quem só despertaria
Um infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha, que tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por que à princesa vem.

A princesa adormecida
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o infante, esforçado.
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
É falso, ele vem seguro,
E vencendo a estrada e muro
Chega onde em sono ela mora.

E inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A princesa que dormia.


O QUE OBSERVAR NOS GÊNEROS:
Na carta:
Local, data, saudação, vocativo (destinatário), assunto em discurso informal, despedida, remetente.
Relato:
Texto subjetivo, às vezes, repleto de detalhes, minúcias, outras vezes apenas um relato. Os verbos que deverão expressar subjetividade estarão sempre em primeira pessoa e no tempo pretérito perfeito, às vezes, imperfeito também, quando for uma experiência vivenciada.
Exemplo:
“Não sei bem dizer como aprendi a ler. A circulação entre os livros era livre (tinha que ser, pensando bem, porque eles estavam pela casa toda, inclusive na cozinha e no banheiro), de maneira que eu convivia com eles todas as horas do dia, a ponto de passar tempos enormes com um deles aberto no colo, fingindo que estava lendo e, na verdade, se não me trai a vã memória, de certa forma lendo, porque quando havia figuras, eu inventava as histórias que elas ilustravam e, ao olhar para as letras, tinha a sensação de que entendia nelas o que inventara.” (in: Um brasileiro em Berlim. Rio de Janeiro: editora Nova Fronteira, 1995. P. 137). João Ubaldo Ribeiro
A receita:
Escrita de itens em forma de lista, seguida do modo de preparo. Observar o título, a lista e os verbos no modo imperativo.
Propagandístico/publicitário:
Repleto de linguagem figurada. A função referencial aparece, mas as funções da linguagem mais evidentes são a conativa/apelativa e poética. Observar  figuras de linguagem, imagens, às vezes, rimas e os verbos no modo imperativo.
Exemplo:
Grave com Philips
E agudo também

Observe que a proposta do texto é a ambigüidade. A partir do adjetivo “agudo” é que constitui o duplo sentido do adjetivo da palavra “grave” que desempenha a ação de verbo no modo imperativo e a função qualificadora de adjetivo.
Instrucional:
Tem o caráter de guia, enumerando ações, nas quais subentendem primeiro faça isso, depois isso, etc.


SUGESTÕES DE LEITURA
A incapacidade de ser verdadeiro (Carlos Drummond de Andrade)
Paulo tinha fama de mentiroso. Um dia chegou em casa dizendo que vira no campo dois dragões-da-independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas.
A mãe botou-o de castigo, mas na semana seguinte ele veio contando que caíra no pátio da escola um pedaço de lua, todo cheio de buraquinhos, feito queijo, e ele provou e tinha gosto de queijo. Desta vez Paulo não só ficou sem sobremesa como foi proibido de jogar futebol durante quinze dias.
Quando o menino voltou falando que todas as borboletas da Terra passaram pela chácara de Siá Elpídia e queriam formar um tapete voador para transportá-lo ao sétimo céu, a mãe decidiu levá-lo ao médico. Após o exame, o Dr. Epaminondas abanou a cabeça:
__Não há nada a fazer, dona Coló. Este menino é mesmo um caso de poesia.

DRUMMOND de Andrade, Carlos. A incapacidade de ser verdadeiro. In: O sorvete e outras histórias. São Paulo: Ed. Ática, 1993, p. 40.

Contos de Marina Colasanti do livro Uma idéia toda azul

Os contos da autora desenvolvem-se  de forma interdiscursiva com os mitos,  há intertextualidade com alguns motivos dos contos de fadas tradicional, e a sua temática principal é a  constituição de identidade.





[1] Todos os parágrafos que forem seguidos do nº de página, na íntegra, são cópias de Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins fontes, 1992 -  de Bakhtin, M.
[2] FIORIN, José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: editora Ática, 2006.