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quinta-feira, 31 de maio de 2012

Literatura no pátio


O gosto pela leitura começa com exemplos. Quando presenciamos hábitos de leitura na família, nas comunidades, nas escolas a tendência é apreciar tais hábitos como necessários e corriqueiros. A escola é um dos principais espaços para a implementação de tais exemplos de leitura.




segunda-feira, 28 de maio de 2012

Projeto " Gincana de Leitura"


GINCANA DE LEITURA  NA ESCOLA – GÊNEROS “DO LIVRO DE TEXTOS DO ALUNO DO 2º ANO” DO PROGRAMA “LER E ESCREVER”
Disciplina: Classe Comum e Oficinas Curriculares
Público Alvo: alunos do 1º ao 5º ano
Período: do 2º ao 4º bimestre
Responsáveis : Todos os professores e a direção
 Representante dos professores: Marlene Manzi

Quando se pensa a literatura erudita, inevitavelmente, o pensamento reconhece as narrativas orais, pois a erudita bebe constantemente na fonte das narrativas orais. Considerando tal observação, vê-se que é mesmo no ciclo I que tais leituras devem permear o cotidiano escolar de forma que, além de garantir o resgate da cultura popular, também forme o leitor que lerá e entenderá a literatura erudita hoje, amanhã e sempre.
Leitura de parlendas, trava línguas, adivinhas, piadas, cantigas, canções, poesias, contos, fábulas, lendas, mitos, receitas, brincadeiras  e biografias.

1ª Gincana:  25/05/12 -  Parlendas






















































2ª Gincana: 01/06 e 04/06 -  Adivinhas

Considerações sobre a forma simples ADIVINHA
Todas as citações marcadas por aspas foram extraídas, na íntegra, do livro  Formas Simples de André Jolles, Tradução de Álvaro Cabral, 1976, Editora Cultrix, São Paulo

Os textos que foram organizados a partir da oralidade são classificados como Forma Simples. A Adivinha é uma forma bastante interessante se observarmos desde a sua origem a sua estrutura, bem como o seu uso na linguagem humana. A Adivinha “é constituída por pergunta e resposta”. (p.109) E ela está presente na vida das pessoas através de jogos infantis, da sessão de passatempo dos jornais e revistas. De acordo com Jolles, por mais difícil que seja uma Adivinha ela sempre deverá ter uma resposta, porque “uma Adivinha insolúvel não é uma Adivinha”. (p. 111).
Semelhança com o Mito
O mito é outra forma simples que contém pergunta e resposta. “Mas trata-se de outro saber e de outra curiosidade. No Mito, o homem interroga o universo e seus fenômenos acerca da natureza profunda deles, e o universo dá-se a conhecer numa resposta, numa ‘profecia’. Na adivinha, o homem já não está em relação com o universo: há um homem que interroga outro homem e de modo tal que a pergunta obriga o outro a um saber. Um dos dois possui o saber, é a pessoa que sabe, o sábio; o interlocutor o enfrenta e é levado, pela pergunta, a pôr em jogo suas forças, seus recursos e sua vida, para chegar  a possuir também o saber e apresentar-se ao outro como sábio.[  ] Na forma do Mito, somos os indagadores; na Adivinha, somos os indagados – e de tal modo que devemos responder. É por isso que o Mito ostenta as cores da liberdade, a Adivinha as do constrangimento; por isso, o Mito é atividade, a Adivinha passividade. É por isso também que o Mito alivia enquanto a Adivinha oprime. E não é por mero acaso que o equivalente em velho-alto alemão da Adivinha era a palavra tunkal, que significa ‘a coisa tenebrosa’”. (p. 112).
Origem
De acordo com especialista, há um grupo de tipologias. Um deles é “o Grupo de Enigmas da Esfinge. Os Exemplos são muito conhecidos: temos a história da Esfinge, Turandot, o Imperador e o Abade, o Companheiro de Viagem de Andersen e todas as outras variantes. O examinador é, nestes casos, um ser mais ou menos cruel, ou uma princesa ou um rei, enfeitiçados e ligados a poderes maléficos. [ ] Em todos os casos, porém, a fórmula é sempre a mesma: “Adivinha ou morre!” Em todos os casos, trata-se de uma prova capital, na acepção mais profunda do termo. (p.113)

Adivinha da Esfinge
Quem anda de quatro patas de manhã, duas ao meio dia e três patas à tarde? (aqui, a manhã, o meio dia e a tarde não significam obrigatoriamente os momentos do dia, e sim, as fases principais da vida humana. E as patas, ou pernas, não se reduzem a uma parte do corpo).

Outro grupo, o de Enigmas de Ilo, “derivado de uma de suas mais freqüentes atualizações.” (p. 114). Este conto-adivinha ou simplesmente adivinha é muito conhecido e possui quatro ou cinco versões:
“[sobre Ilo vou,
Sobre Ilo estou,
Sobre Ilo, a bela e gentil.
Adivinhem, meus senhores, o que isto quer dizer.]”. (p.114)

“Eis uma das explicações: ‘Uma jovem fora acusada de ter morto uma criança mas, outrora, quando se era condenado à morte, se se pudesse apresentar aos juízes uma adivinha e estes não soubessem decifrá-la, então o réu era solto. A jovem tinha um cão a que chamava Ilo e com a pele do animal fizera um par de sapatos. No dia seguinte, ela calçou os sapatos, foi até os juízes e propôs-lhes sua adivinha. Os juízes não puderam adivinhar e a moça foi posta em liberdade’. Além da adivinha do Ilo, tomada em seu sentido estrito, entram neste grupo inúmeras adivinhas apresentadas e contadas com explicações semelhantes, como ‘Duas pernas sobre três pernas’, ‘Não-nascido’ etc. Portanto, apresenta-se aqui uma adivinha que proporciona a liberdade e a vida se não for adivinhada. A questão é posta pelo acusado e equivale a dizer: ‘Apresenta uma adivinha e viverás’.
Tudo se passa como se as duas categorias convergissem a partir de pólos opostos de uma só disposição mental. Não poder resolver uma adivinha é morrer; apresentar uma adivinha que ninguém resolve é viver”. (p.114).

A Adivinha goza das prerrogativas da ambigüidade. “Ela não apenas é redigida na língua especial de um grupo como redigida de modo a dar ao não-iniciado a impressão de ser incompreensível. [ ] ‘pé de montanha’ pertence à língua especial e [ ] a pergunta ‘O que é que tem um pé e não pode caminhar?’ é uma Adivinha. Que é, então, que faz a Adivinha? Ela reconduz da língua especial à língua comum, do pé cuja ambigüidade pode sustentar várias coisas, ao pé humano, parte do corpo sem ambigüidade; e torna a língua especial incompreensível a partir da língua comum.

Nilda Maria Medeiros
Mestre em Estudos Literários e Pós graduada em Teorias Linguísticas e Ensino pela Unesp de Araraquara








3ª Gincana : Cantigas de Roda e Brincadeiras

As cantigas e brincadeiras de roda são manifestações folclóricas onde as crianças se dão as mãos, formam uma roda e cantam melodias que podem ou não ser acompanhadas de coreografia.
Antigamente, eram muito comuns no cotidiano infantil da criança brasileira. Hoje, no entanto, é uma manifestação que está sendo esquecida, pois as crianças estão mais interessadas em outros tipos de música e brincadeiras.
As cantigas de rodas, tanto brasileiras quanto estrangeiras, são basicamente folclóricas. Possuem letras, melodias e ritmos simples e lúdicos, envolvendo brincadeiras, danças e trava-línguas. As músicas utilizam, normalmente, um compasso binário.
Alguns acreditam que são originárias de modificações feitas em músicas de autores populares ou criadas anonimamente pelo povo. Por serem repassadas, de geração em geração, através do que se chama transmissão oral, é comum existirem diferenças regionais nas letras de algumas delas.
As brincadeiras de roda ajudam a sociabilizar e desinibir as crianças, uma vez que exigem o olhar frente a frente, o toque corporal, a exposição, pois em muitas delas cada um deve se apresentar no centro da roda. Auxiliam no desenvolvimento da expressão corporal, senso rítmico e organização coletiva. São também um dos elementos importantes para a integração e o lazer infantil.  Texto de Lúcia Gaspar.



4ª Gincana : Receitas

As receitas são um gênero textual muito adequado para incluir na rotina das turmas que estão na fase inicial do processo de alfabetização. É um gênero de circulação social bastante corrente, presente em todas as classes sociais (mesmo nas cozinhas mais precárias se podem encontrar receitas que estão impressas nas embalagens de produtos básicos como o óleo ou o arroz). Sua estrutura –  uma pequena ficha (tempo de preparo, rendimento e grau de dificuldade, em alguns casos), uma lista e depois um parágrafo, geralmente com os verbos nos modos imperativo ou infinitivo – facilita as antecipações e permite que se coloque em prática uma série de comportamentos de leitor relacionados a ler para fazer alguma coisa, um dos importantes propósitos sociais de leitura que nossos alunos precisam aprender.









Bingo da Higiene

Atividade desenvolvida pela professora de " Saúde e Qualidade de Vida" - Graziela Antonângelo.

Projeto - Saúde Bucal



Disciplina: Oficina Curricular: Saúde e Qualidade de Vida
Transversalidade: Saúde e Cidadania
Público Alvo: 1º ao 5º ano
Período de Realização: 2º, 3º e 4º bimestres
Professora Responsável: Graziela Antonângelo


Considerando que a criança permanece das 7h às 16h10 min. na escola, faz-se necessário o esforço para a implementação da escovação dentária após o almoço, de forma a ensinar a saúde bucal e praticá-la com orientações dos professores. Embora a escola não conte com local apropriado vem se implementando adequações.


No dia 01/06 os alunos do 5º ano assistiram uma palestra com o Dr. Luiz Paulo, dentista da escola, onde receberam orientações de como manter os dentes saudáveis.

O projeto " Escovação na escola" acontece todos os dias após o almoço e já é perceptível as melhoras nos hábitos dos alunos. Segundo o dentista da escola, Dr. Luiz Paulo a melhora também é visível nos dentes dos alunos




O Pronome pessoal de terceira pessoa


 O pronome pessoal de terceira pessoa: a referenciação pronominal  textual na crônica “Tentação” de Clarice Lispector - Nilda Maria Medeiros


“Tentação”
Ela estava com soluço. E como se não bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.
Na rua vazia as pedras vibravam de calor -  a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher? Por enquanto ela estava num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.
Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmão em Grajaú.A possibilidade de comunicação surgiu no ângulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.
Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando seu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.
Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passava? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.
Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos.
Que foi que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos – lá estava uma menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.
Mas ambos eram comprometidos.
Ela com sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com sua natureza aprisionada.
A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-lo dobrar a outra esquina.
Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás.

LISPECTOR, Clarice. Tentação. In: A legião estrangeira. São Paulo. Ática, 1977. pp.59-60.

O pronome pessoal, como já dito, de acordo com Neves (2000, p.449), “tem uma natureza fórica, isto é, ele é um elemento que tem como traço categorial a capacidade de fazer referência pessoal:” a algo ou a alguém de forma anafórica ou cataforicamente referidos no texto, conforme se observa com os pronomes de terceira pessoa.
Considerando a natureza fórica do pronome pessoal, já observamos, na crônica “Grande Edgar”, uma de suas funções básicas: a interacional, que se refere à fala em discurso. E, na crônica “Tentação”, observaremos a sua função de fazer remissão textual, que se refere a elementos do próprio texto. (NEVES, 2000, p.452).

“Tentação”

Ela estava com soluço. E como se não bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.
Na rua vazia as pedras vibravam de calor -  a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher? Por enquanto ela estava num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.


A crônica inicia-se com o pronome pessoal Ela fazendo referência a algo que ainda não fora apresentado no discurso. Em seguida, repete-se o mesmo pronome acrescido de uma informação, a de que esse ela era ruiva. No segundo parágrafo é que se sabe que o pronome de terceira pessoa ela é referenciador do referente menina. E, logo em seguida, o ela a retoma.
Ainda no mesmo parágrafo, a expressão uma menina ruiva é o referente propriamente dito. É interessante observar que menina aparece de forma indefinida, marcando o inédito para o enunciador que, em seguida, dirá que elas se olharam. O pronome pessoal oblíquo nos introduz o enunciador no discurso incluindo-se ao ator menina (nós= eu e ela).
O possessivo sua, bem como os oblíquos [l]a e a fazem remissão textual à menina, a qual é retomada pelo pronome pessoal ela.
Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmão em Grajaú. A possibilidade de comunicação surgiu no ângulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.
Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando seu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.
Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passava? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.


No terceiro parágrafo é apresentado outro ator na cena narrativa. E a remissão a esse novo referente se dá cataforicamente através do possessivo sua, referenciador da menina ruiva. A catáfora nominal um irmão é referenciador do sintagma cão. Um basset lindo, miserável, doce, ruivo, ele, seu, fazem remissão a cão. Logo em seguida os dois atores são referenciados por menina e cachorro.
 É interessante observar que, no parágrafo anterior, o referente menina aparece após um artigo indefinido. Também o cão, no parágrafo em questão, vem após um artigo indefinido. Mas no momento do conhecerem-se, bem como do enunciador os conhecer passam a ser referidos seguidos de artigos definidos.
Ainda tratando dos pronomes de terceira pessoal que fazem remissão textual, observa-se o [d]ela retomando menina, o ela retomando [d]ela e o oblíquo a retomando ela. O oblíquo o retomando ele, o pronome ele retomando aquele cachorro e o oblíquo  [l]o retomando ele.

Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos.
Que foi que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos – lá estava uma menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.


O pronome reflexivo se faz referência aos dois atores: a menina e o cachorro, bem como o pessoal eles. No parágrafo observado, o referente menina ruiva é referenciado por criança vermelha.

Mas ambos eram comprometidos.
Ela com sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com sua natureza aprisionada.
A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-lo dobrar a outra esquina.
Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás.


O pronome ela por duas vezes faz remissão à menina. O pronome pessoal ele e o possessivo sua fazem remissão a cachorro, o qual é retomado pelo referenciador basset ruivo. O oblíquo se refere-se a basset, bem como o oblíquo o retoma o se, e o [l]o retoma o o e, em seguida, é retomado pelo pessoal ele.
É interessante pensar na construção desse texto a partir dos elementos em análise, atentando para o processo de geração de sentido no texto.
Em “Tentação”, o enunciador relata e descreve uma cena cotidiana a que se submetera. Como algo se dá a partir de seres desconhecidos e que, só após observações e reflexões desse enunciador intimista sabe-se da situação por que passam a menina e o cão ruivos – também a estratégia de construção dos enunciados opera por pronomes antes de apresentar o nome, bem como a apresentação do cão como sendo um irmão por já inferir a solidão da menina. A raça e a característica ruiva são descritas posteriormente porque são elementos observáveis só quando estão frente a frente, mas que o cão lhe seria um irmão, sabe-se de longe.
É a estratégia, a meta discursiva, gramatical (?), somando sentidos no tecido textual.
 
BIBLIOGRAFIA 
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. São Paulo:Companhia Editora Nacional, 1982.
IGNÁCIO, Sebastião Expedito. Análise Sintática em Três Dimensões. Franca (SP): Ribeirão Gráfica e Editora, 2003.
LISPECTOR, Clarice. Tentação. In: A legião estrangeira. São Paulo. Ática, 1977. pp.59-60.

NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática de Usos do Português. Araraquara (SP): Unesp, 2000.
_______ . Texto e gramática. São Paulo: Contexto, 2007.